Ação social pode usar coaching para despertar potencial nos jovens de contextos vulneráveis

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Se Susana Torres conseguiu extrair a grandeza do Eder, levando-lhe da bancada do Braga para o golo da seleção que fez Portugal campeão da Europa em 2016, fazendo-lhe ver e acreditar no seu potencial, os técnicos sociais podem utilizar as estratégias de coaching para multiplicar muitos possíveis Eders que enchem a panorâmica dos contextos de intervenção social.

A Praça do Comércio estava apinhada de gente. A minha esperança de ter um curso intensivo sobre a Seleção com o filho da minha amiga desapareceu ao perceber que ele estava ali pelo espírito do país e não pelo amor à bola. Sabia tanto ou menos que eu ou a minha amiga. As pessoas estavam colocadas nos lugares mais estranhos, até em cima do telhado dos edifícios para alcançar a tela que projectava o final do Europeu entre Portugal e França. Outros estavam nas faixas dos monumentos. O ambiente era de entusiasmo e festa. O jogo começou. O filho da minha amiga revelou ser útil, pelo seu metro e setenta e cinco, que nos ia traduzindo o que se passava na tela. O nosso metro e cinquenta e sete tirava-nos a vista. Íamos percebendo o jogo pela reação do público. Houve uma altura que apareceu uma brecha, conseguimos ver a tela. Vimos a bola a rolar para a baliza e as pessoas estavam a ranger os dentes e, atrás de mim, um senhor incitava a bola a continuar. Virei-me  com um olhar questionador e ele encolheu os ombros e abriu as mãos: “Desolé”. “Também estão cá, malditos franceses!”, pensei. 

O filho da minha amiga tinha um pressentimento que alguma coisa ia acontecer. E aconteceu.

Depois do Cristiano Ronaldo se lesionar, a magia desapareceu. Os braços caíram e levaram com eles os ombros e a euforia. Os apupos de esperança desapareceram. Apenas os franceses incitavam os seus, o que mal se percebia de tão pouco que eram. Eu fui pela magia que estava no ar. As pessoas juntaram-se para torcer por uma causa. Soube mal sentir o peso da desesperança de uma praça inteira. Para mim, a festa terminou aí. Aguentei até ao final dos 90 minutos e não fiquei para o prolongamento. No comboio, o filho da minha amiga estava ligado à notícia do último minuto. Ele tinha um pressentimento de que alguma coisa iria acontecer. E aconteceu.

O comboio entrou em Campolide a apitar desalmadamente. De repente, ouvimos um ruído no interior e suou a voz do maquinista: “é para dizer que somos campeões!”. Gritámos como doidos. “Somos campeões”. O comboio abriu a goela do apito. A partir de Benfica, apitou à entrada de todas as estações. Sentia-se a festa no ar.

Cheguei a casa com uma carga de energia que há muito não experimentava. Quando abri a televisão, dei de caras com esta faixa: Eder dedica o golo da vitória à sua mental Coach Susana Torres. Algo suou dentro de mim. Quem é o Eder, quem é a Susana? Fui à net procurar. No dia seguinte, estava tudo escarrapachado em toda a comunicação social.

Estava na reta final da dissertação do mestrado em Economia Social e Solidária. Nessa altura, a minha certeza da saída da associação para trabalhar apenas como coach tinha-se transformado em dúvida. “Se a Coach Susana Torres conseguiu despertar o génio que existe no Eder com ferramentas de coaching, é provável que eu consiga despertar os génios que existem nos jovens com o perfil do Eder no contexto da associação”, pensei.

Fazendo uma retrospectiva, sempre ajudei as pessoas a perceberem que são capazes de muito mais e agirem em prol disso. A única diferença são as variáveis que envolvem esta desenvoltura, que arrastam o tempo desses resultados e, por vezes, até se perdem se pelo caminho. 

Por isso, sonhava em aplicar este conhecimento em pessoas conscientes, em vez de eu os entregar em beberrão condimentado. Assim, ia mudar a minha vida de agente de transformação social para agente de transformação pessoal.

A possibilidade de réplica dos Eders que enchem a panorâmica da minha vida profissional

No dia seguinte, a imprensa não falava de outra coisa que não fosse do herói improvável. A história de Eder comoveu o país. Eu fiquei comovida com a possibilidade da réplica das ferramentas do “mental coaching” de alta performance nos muitos possíveis Eders que enchem a panorâmica da minha vida profissional. Ficou-me essa ideia, mas não sabia como. 

Dias depois, numa entrevista ao programa “Alta Definição”, onde o Eder falou do seu percurso, da sua história, da sua infância, reconheci nele pontos comuns com inúmeros miúdos que se encontram à margem ou perdidos por aí. Comecei a pensar, como seria se os resgatássemos antes de eles se perderem? Quando Eder disse que gostaria de trabalhar com crianças vulneráveis para que não viessem a passar pelo que ele passou, pensei: “eu vou trabalhar com ele nisso”.

Com dois projetos de intervenção comunitária  para inclusão de pessoas de contextos socioeconomicamente desfavorecidas a decorrer no âmbito do Programa Escolhas, comecei a experimentar com a equipa a aplicação de ferramentas de coaching no processo de construção de projeto de vida para jovens desocupados e sem qualificação profissional. Ajudamos-lhes a ver que possuem muito mais recursos do que imaginam, ressignificando o valor das suas experiências, sobretudo no futebol. Curiosamente, aumentamos para o dobro a integração no mercado de trabalho.

Fusão do conhecimento de coaching com a experiência da ação social

E, desde então, tenho pensado como potenciar isso. Ocorreu-me fundir os conhecimentos de coaching com a experiência da ação social e criar recursos que possam ser aplicados tanto nos técnicos sociais que trabalham com jovens de contextos vulneráveis, como no trabalho direto com os jovens. Foi assim que surgiu BAZA, um programa de construção de caminhos para o destino imaginado pelos jovens, mediante o desenvolvimento dos softskills para empoderamento pessoal e para a empregabilidade, mais conhecido entre os jovens como “BAZA BULIR”. 

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